quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

SUSTENTABILIDADE - UMA VISÃO HUMANISTA

O conceito de sustentabilidade transcende o exercício analítico de explicar a realidade e exige o teste de coerência lógica em aplicações práticas, onde o discurso é transformado em realidade objetiva. Os atores sociais e suas ações adquirem legitimidade política e autoridade para comandar comportamentos sociais e políticas de desenvolvimento por meio de prática concreta. A discussão teórica, portanto, revela uma luta disfarçada pelo poder entre diferentes atores sociais, competindo por uma posição hegemônica, para ditar diretrizes e endossar representações simbólicas de sustentabilidade, seja em termos de biodiversidade, sobrevivência do planeta ou de comunidades auto-suficientes e autônomas.
Sustentabilidade também nos remete a uma dimensão temporal pela comparação de características de um dado contexto ecológico e sociocultural no passado, no presente e no futuro. O primeiro serve como parâmetro de sustentabilidade, enquanto que o último requer a definição do estado desejável da sociedade no futuro. Experiências políticas passadas, que tentaram impor às gerações presentes os sacrifícios necessários para construir o futuro, revelam o relacionamento conflituoso e complexo subjacente a um problema aparentemente simples conceitual ou taxonômico. Enquanto as práticas dominantes na sociedade (econômica, política, cultural) são determinadas pelas elites de poder; essas mesmas elites são também as principais referências para a produção e disseminação de idéias, valores e representações coletivas. Assim, a força e a legitimidade das alternativas de desenvolvimento sustentável dependerão da racionalidade dos argumentos e opções apresentadas pelos atores sociais que competem nas áreas política e ideológica. Cada teoria, doutrina ou paradigma sobre sustentabilidade terá diferentes implicações para a implementação e o planejamento da ação social.
Instituições e políticas relacionadas à sustentabilidade são construções sociais, o que não significa serem menos reais. Entretanto, sua efetividade dependerá em alto grau da preferência dada às proposições concorrentes avançadas e defendidas por diferentes atores sociais. Portanto, é útil começar com uma breve revisão dos principais argumentos que as várias correntes e atores têm desenvolvido a fim de dar plausibilidade e substância a suas diversas reivindicações de sustentabilidade
Para construir uma sociedade sustentável, é essencial entender que um meio ambiente saudável é condição necessária para nosso bem-estar, o funcionamento da economia e, enfim, a sobrevivência da vida na terra. Entretanto, a vida – individual e social – não pode ser reduzida somente às funções biológicas e de produção-consumo.
Cooperação, compaixão e solidariedade são valores vitais para sobrevivência e a qualidade de vida.
Participação consciente e ativa nas decisões sobre sua própria vida e a vida coletiva dá significado ao empenho humano. Contudo, mesmo democracia e participação que proporcionam direitos e oportunidades eqüitativas para acesso à informação, trabalho, serviços básicos sociais e culturais não são garantias suficientes para a sustentabilidade. Políticas ambientais racionais, assim como eficiência econômica baseada em ciência e tecnologia, podem ser condições necessárias mas não suficientes para a sustentabilidade sociocultural. Esta exige um sistema político com poderes para planejar, coordenar, e fornecer diretrizes a um infinito número de unidades autônomas, independentes, administradas democraticamente e no completo controle de seus recursos. Tal sistema permitiria a criatividade e auto-realização de seus membros, de acordo com suas vocações, interesses e personalidades.
O mais importante avanço na evolução do conceito de sustentabilidade é representado pelo consenso crescente que esta requer e implica em democracia política, equidade social, eficiência econômica, diversidade cultural, proteção e conservação do meio ambiente. Esta síntese, ainda que não aceita por todos, tenderá a exercer uma influência poderosa na teoria e na prática social, nos anos vindouros.


Este texto foi retirado da revista O SciELO- Scientific Electronic Library Online (é uma revista subsidiada pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo), escrito pelo pensador e autor Henrique Ratter , licenciado em Ciências Sociais, mestrado em Sociologia, doutorado em Economia Política da Universidade de São Paulo e pós doutorado em Planejamento Urbano e Regional pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts - M.I.T - EUA. É diretor nacional do programa Leadership for Enviromment and Development - LEAD da Universidade de São Paulo e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Economia, Sociedade e Meio Ambiente - NAMA. Atualmente é professor titular aposentado da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, coordenador de pesquisas e consultor de instituições nacionais (CNPq, FINEP, MCT, SEPLAN-SP, SENAI, SEBRAE) e internacionais (Organização Panamericana de Saúde, Organização Internacional do Trabalho - OIT, Universidade das Nações Unidas - UNU, UNESCO, Banco Mundial).

Nenhum comentário:

Postar um comentário